Artículo

Contratação coletiva: funcionamento, vantagens e desvantagens

É inegável o papel fundamental da contratação coletiva na regulação e complementaridade à legislação laboral. Assume-se, por isso, como o esplendor máximo do compromisso entre trabalhadores e empregador na determinação de elementos normativos relevantes para as relações de trabalho em cada setor. Aliás, agora, mais do que nunca, num contexto de guerra, impulsionador de uma inflação sem precedentes, a negociação coletiva poderá apresentar-se como uma ferramenta chave para a adaptação das empresas a momentos de crise.

Ora, o processo desencadeado pela contratação coletiva é, no fundo, uma negociação entre empregadores e representantes dos trabalhadores, sobre condições específicas de trabalho a aplicar a determinada empresa ou setor de atividade. Pelo que, a existência de uma convenção coletiva aplicável às relações de trabalho, será, à partida, globalmente mais favorável, considerando que espelha o resultado de uma negociação equilibrada entre as partes. Paralelamente, a vinculação a um instrumento de regulamentação coletiva impedirá o afastamento das regras constantes do mesmo, nomeadamente, no que tange à alteração das condições salariais. A grande vantagem passa pela introdução de um acervo normativo com a capacidade de se ajustar às caraterísticas específicas de um determinado setor, permitindo que as partes possam ter intervenção decisiva nesta calibração.

Uma das questões mais fraturantes neste contexto, que se traduzirá, inevitavelmente, numa desvantagem, é a escassa representatividade dos sindicatos, principalmente no setor privado. Vejamos.

Na realidade, no sistema português de contratação coletiva não existem verdadeiros critérios de representatividade sindical, ou seja, qualquer sindicato, independentemente da sua dimensão, poderá celebrar convenções coletivas. Neste ponto, importa clarificar que, apesar de a convenção coletiva ter uma eficácia inter partes – determinada pela filiação do empregador e do trabalhador (princípio da dupla filiação) –, os seus efeitos poderão ser estendidos, através de Portarias de Extensão, a trabalhadores e empregadores que inicialmente não seriam abrangidos.

Por comparação ao ordenamento jurídico espanhol, deparamo-nos, desde logo, com uma diferença estrutural, onde os convenios estatutarios produzem eficácia erga omnes. Isto é, a convenção coletiva no contexto espanhol abrange, durante toda a vigência, todos os trabalhadores incluídos no âmbito funcional e territorial da convenção, independentemente da filiação. No entanto, para que tal suceda, é necessário que a negociação tenha decorrido conforme os requisitos plasmados no Estatuto de los Trabajadores, designadamente, respeitando as maiorias representativas detidas pelos negociados. Caso contrário, será de eficácia limitada.

Retomando, a falta de critérios de representatividade sindical possibilita a existência de convenções coletivas celebradas por sindicatos mais débeis (sem real independência), representando um potencial perigo, caso essas convenções sejam estendidas a trabalhadores e empregadores filiados a outros sindicatos ou associações de empregadores[1], condicionando a realidade de determinado setor. Referimo-nos, na verdade, a um perigo evidente, já que em 2016 se registava uma taxa de sindicalização de 15.3%[2], por contraposição à taxa de cobertura pela negociação coletiva no mesmo ano, de 74,1%[3]. Ou seja, o fenómeno que faz disparar a amplitude da cobertura das convenções coletivas não é o da filiação, mas antes, o das Portarias de Extensão. Portanto, a falta de representatividade dos sindicatos afeta a legitimidade negocial e assume-se como uma grande desvantagem da negociação coletiva em Portugal.

contratação coletiva

Com efeito, tem-se verificado que as potencialidades da contratação coletiva não se têm estendido a pontos chave, designadamente, a certos mecanismos de flexibilização do tempo de trabalho, altamente benéficos para um aumento de produtividade e obtenção de sinergias nas organizações. Referimo-nos, por exemplo, à instituição do regime de banco de horas, tratado como um tema tabu no âmbito da negociação coletiva de determinados setores, o que não se concebe. Isto porque, em contexto de referendo para implementação do regime de banco de horas grupal, os trabalhadores demonstram-se, em grande escala, recetivos a este mecanismo, principalmente, por se apresentar como uma ferramenta capaz de potenciar a conciliação da atividade profissional com a vida familiar. Daí a importância da filiação de uma empresa na associação de empregadores do setor onde se insere, para que possa desempenhar um papel relevante na condução da negociação coletiva e na conformação prática de regras laborais aplicáveis. O que, naturalmente, resultará numa convenção coletiva adaptada a um determinado contexto setorial laboral.

Apenas com um verdadeiro envolvimento das empresas na vida das associações de empregadores se torna possível lutar por condições de trabalho cada vez mais ajustadas à evolução dos tempos.”

A negociação coletiva, em geral, deveria ter o papel dinamizador das relações de trabalho, compondo e complementando o legislador ordinário, sob pena de perder a sua importância, deixando de assumir um papel normativo vital nas relações laborais em Portugal.

*Além da autora assinante, este artigo é da coautoria de Rita Marques Nossa*

 

[1] Cfr. Gomes, Júlio, “A contratação colectiva in peius e a representatividade sindical”, in Crise Económica: Fim ou Refundação do Direito do Trabalho?, AAFDL, 2016, pp. 91-121 (p. 112).

Você pode estar interessado
Gracias por tu participación
Comparte el manifiesto y contribuye a impulsar la innovación entre empresas, organizaciones y directivos.
Agora você está vendo o conteúdo de APD zona centro.
Se desejar, pode aceder ao conteúdo adaptado à sua área geográfica