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Quais são as perspetivas económicas para 2021?

Os tempos conturbados que se vivem atualmente apresentam um panorama de incerteza sem precedentes. O tecido empresarial, a nível global, enfrenta necessidades profundas de reestruturação e mudança, e os desafios no contexto português demonstram-se particularmente acentuados. Mas quais são as perspetivas económicas que podemos antever?

Num momento em que as consequências económicas a longo prazo, resultantes da crise pandémica que estamos a enfrentar desde o início de 2020, já podem começar a ser avaliadas, os setores de atividade que saíram mais prejudicados são também os de maior atuação em Portugal.

Pese embora o indubitável cenário de dificuldade, as atualizações sobre o futuro não se ficam pelo negativo. Os ciclos de transição que se têm vindo a desenrolar, para fazer frente às problemáticas mais recentes, também permitiram uma aceleração incalculável no desenho de soluções viáveis para amortizar a quebra registada no consumo.

Numa breve introdução sobre o mote do evento “Perspetivas APD 2021”, o engenheiro Ângelo Ramalho, Presidente da EFACEC e moderador da sessão, descreve a complexidade da crise pandémica. As sucessivas vagas da COVID-19, e a inescapável recessão consequente, deu origem a um conjunto de macrotendências para os próximos anos. A demografia irá alterar-se de forma significativa e levantam-se questões ambientais, económicas, políticas e geopolíticas, tecnológicas – nomeadamente no que toca à 4.ª revolução industrial – e mesmo culturais cuja abordagem irá ditar a criação de soluções para o país.

Sabemos que a pandemia provoca efeitos em todos os setores, normalmente assimétricos. E num país que é particularmente vulnerável, é fácil reconhecê-lo.

Perspetivas económicas: os efeitos imediatos

Estamos há mais de um ano inseridos num ecossistema de crise pandémica. O distanciamento social e o confinamento obrigatório afetaram, e continuam a afetar, a economia mundial de uma maneira avassaladora. Rui Constantino, economista-chefe do Banco Santander e especialista em Economia Monetária e Financeira, enfatiza a necessidade de reestruturação das empresas, que foram obrigadas a adaptar-se a um novo contexto em que a proximidade física e os contatos sociais têm que ser reduzidos ao máximo.

Ao mesmo tempo, o confinamento veio mostrar que o processo de relocalização ganhou ainda mais importância, porque o mundo, sobretudo a Europa, deparou-se com a falta de equipamentos necessários para combater a pandemia. O processo de passagem do processo industrial e a transferência das unidades produtivas para a Ásia, sobretudo para a China, apresenta demasiados custos e, portanto, “acentua o processo de transformação que se irá iniciar”, reforça.

O especialista ressalva, também, as evidentes dificuldades que este cenário coloca. A capacidade de produção e de vacinação, que é e continuará a ser diferente entre os países, não favorece uma recuperação uniformizada entre as economias e pode representar um desafio acrescido na devolução de Portugal aos níveis pré-pandemia. Além disso, as empresas estão num momento crítico e podem não existir fundos disponíveis para promover uma regeneração ágil.

Ao nível das empresas, as que partem com níveis elevados de dívida estarão focadas em reestruturação e não em investimento, o que pode condicionar o seu processo de recuperação.

Também como resultado da crise, renova-se o grande foco na reindustrialização, associado à descarbonização. Constantino assinala a notória diminuição do papel das economias europeia e americana na produção industrial a nível global, como consequência da deslocalização dessa atividade para outros mercados, nomeadamente para a China. Segundo a opinião do especialista, essa mudança acentua a necessidade de trazer uma parte da indústria novamente para a Europa, o que deverá ser sinónimo da introdução de novos processos produtivos e de novas atividades – não apenas a atividade industrial de assemblagem que havia sido deslocalizada.

Isto implica uma reestruturação, no caso português, de todo o tecido empresarial, no sentido de não focar naquilo que foi o modelo do passado, em que beneficiávamos de custos salariais baixos.

É, portanto, necessária uma maior integração de serviços na produção industrial, ou seja, gerar maior valor acrescentado e, em suma, possibilitar a transformação de uma indústria pesada para uma indústria de serviços.

Paulo Mota, Professor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto e especialista em Economia, Finanças e Política Monetária, apresentou-nos, também, os principais fatores de impacto causados pela COVID-19. Além de considerar que podemos estar na presença da maior crise económica dos últimos 200 anos, o docente reforça que, no território nacional, os obstáculos são, à partida, maiores do que na restante Zona Euro.

Portugal é um país que está a ser especialmente afetado por causa da sua estrutura produtiva.

Esta conclusão prende-se com o facto da pandemia ter atingido, principalmente, os setores de atividade que se encontram sobredimensionados em Portugal – ou seja, acima da média europeia. Falamos, especificamente, do Alojamento e Restauração, do Comércio e dos Transportes. Nestas áreas, os empresários viram-se, não só, obrigados a interromper os seus serviços, como também sofreram particularmente devido à estrutura financeira dos seus negócios, que possuem um elevado peso de custos fixos operacionais.

Por outro lado, Paulo Mota assinala que os momentos de recessão promovem uma postura mais ponderada e reticente por parte das empresas. A desaceleração do investimento empresarial apresentou uma queda de 16% em 2020 – 18,2% na indústria transformadora –, e a incerteza perante o futuro leva a que os investidores adiem a alocação de capital.

Em adição, a quebra no consumo privado também se apresenta como uma consequência expectável, e já confirmada, da crise pandémica. Por isso, o especialista relembra que existem fundamentos económicos profundos para o levar a acreditar que os efeitos irão para lá do imediato. E considerando que esse é o futuro mais certo, será necessário que a política de estabilização, nomeadamente as políticas orçamental e monetária, sejam aplicadas de forma “muito atempada e sustentada”, reforça.

Conter a crise: o Banco Central Europeu

As perspetivas económicas para o cenário pós-pandemia poderiam, certamente, ser mais desanimadoras. A preparação da comunidade europeia para o cenário de crise económica apresenta-se, hoje, bastante melhorada quando em comparação com a crise de 2008. Nessa altura, o Banco Central Europeu começou a atuar em quantitative easing, ou seja, a comprar títulos massivamente, incluindo dívida pública de países em dificuldade, apenas sete anos depois da chegada da recessão – mais concretamente, em 2015.

Como explica Paulo Mota, desta feita, a atuação do BCE foi mais rápida e eficaz.

[O BCE] tem conseguido manter os spreads de dívida pública, por isso, não me parece que possam advir problemas desse lado.

Também Rui Constantino assinala a importância dos bancos centrais neste momento de grande incerteza. O reforço dos programas de aquisição de ativos financeiros, em especial de dívida pública, permitiu que o spread face à dívida alemã fosse devolvido aos valores pré-pandemia.

Ainda assim, Constantino relembra que a atuação do BCE não está assente em dívidas privadas. Sobretudo tendo em conta o contexto europeu, onde a maioria dessas dívidas são bancárias, as mesmas não integram o mercado e, por isso, o BCE não as pode adquirir. Desta forma, e pese embora a valiosa contribuição desse organismo, as populações irão permanecer numa realidade frágil e precária. Em suma, as perspetivas económicas que se apresentam enfatizam a instalação de uma recessão com check-out tardio.

Medidas de mitigação: o apoio às empresas

As medidas de política monetária aplicadas pelo BCE foram, e continuam a ser, decisivas. Têm evitado a fragmentação completa do mercado de obrigações soberanas da Zona Euro e inundado o sistema bancário de liquidez. Através de operações de cedência de liquidez de prazo alargado, direcionadas e não direcionadas, e também da política de taxas de juro negativas, criaram-se todas as condições para que os bancos concedam créditos às empresas e a particulares.

Contudo, as medidas de política de mitigação não podem ficar-se pela atuação do Banco Central. A suspensão temporária das Regras do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), portanto, das regras fiscais da Zona Euro, revelou-se outro passo necessário. Paulo Mota considera que o mesmo é fundamental para que os países possam aplicar estímulos orçamentais e, assim, permitir que os estabilizadores automáticos funcionem.

Também a política orçamental merece um lugar de destaque como instrumento de combate à crise pandémica. O docente da Universidade do Porto assegura que existem razões fidedignas para ter esperança e acreditar nas soluções apresentadas. O Plano de Recuperação e Resiliência, que se encontra em discussão, e que foi recentemente alvo de consulta pública, toca nos aspetos fundamentais e dá o enfoque adequado à política económica de recuperação.

Apesar desta crise ser ainda maior do que a crise financeira [de 2008], aparentemente, as economias parecem estar a aguentar melhor. A crise é diferente, é verdade, mas isto verifica-se sobretudo porque a resposta da política macroeconómica é incomparavelmente melhor.

Simultaneamente, o enfoque no investimento público demonstra-se coerente perante aquilo que a maioria dos estudos aponta como o caminho a seguir num contexto de armadilha de liquidez. Mota explica que os multiplicadores são invariavelmente maiores do que aqueles oferecidos, por exemplo, pelos impostos. Ou seja, o efeito do investimento público é mais vantajoso e eficaz, para alcançar a recuperação, do que a diminuição da carga fiscal sobre as empresas.

Ao nível da investigação e inovação, a União Europeia apresenta um grande consenso na escolha de continuar a promover o desenvolvimento das empresas nesse campo. Rui Constantino afirma que essa é uma atuação valiosa, que deve ser altamente incorporada na lógica do funcionamento empresarial.

O processo de transformação não é algo que se esgota só porque mudamos os processos e, hoje, estamos adequados; vamos ter que o fazer, sistematicamente, ao longo do tempo. Portanto, a capacidade de adaptação é essencial.

Perspetivas económicas: algumas preocupações

O facto das propostas do Plano de Recuperação e Resiliência aparentarem ter sido feitas à medida, não impede que se antecipem algumas preocupações quanto à sua execução. Desde logo, a questão do timing apresenta-se como um desafio, pois o plano implica a aprovação de projetos e, naturalmente, essa condição vem com um relógio anexado. Ou seja, o processo de aprovação pode atrasar a aplicação dos estímulos, que não deverão chegar antes do verão – no cenário atual, estas condicionantes podem revelar-se bastante negativas.

Da mesma forma, a possibilidade dos fundos disponibilizados serem insuficientes para cumprir os objetivos a que se destinam – apesar de ser falar numa “bazuca” – é um fator de apreensão. Paulo Mota relembra que a ambição de, simultaneamente, recuperar e potenciar o crescimento da economia é uma missão árdua.

É muito difícil simultaneamente estabilizar e transformar.

Devido a todas as incertezas que ainda se fazem sentir nas análises dos especialistas face ao contexto português, e apesar das perspetivas económicas da Comissão Europeia, que apontam para uma recuperação no final de 2022, o panorama nacional poderá não acompanhar. Inclusivamente, o Banco de Portugal projetou uma estimativa que, num cenário severo – que tem precisamente todas as caraterísticas deste novo confinamento –, assume que Portugal ainda não terá recuperado em 2023.

Transições Climática e Digital

A questão ambiental e a transformação digital já eram pilares com forte mediatismo antes da chegada da COVID-19. Contudo, a alteração profunda nos estilos de vida e nos quadrantes laborais da comunidade, inaugurados pela pandemia, catapultou essas transições para um novo patamar. Se, antes, estes temas estavam nas agendas governativas e políticas de maior relevo, agora começaram a fazer-se sentir mais diretamente na vida das pessoas.

Rui Constantino é objetivo na sua apreciação quanto às transformações que a pandemia ajudou a desenvolver. O crescimento do e-commerce e a nova rotina de compras pela web veio para ficar. Por isso, a necessidade de modernização e a transformação de procedimentos é imperativa e inevitável.

Vemos uma duplicação, em alguns casos uma quadruplicação, das compras e vendas online através de canais digitais. Este processo irá continuar

Simultaneamente, a descarbonização e a transição climática estão na linha da frente nas políticas de médio prazo, nomeadamente no setor bancário. O especialista dá o exemplo do Santander, que recentemente anunciou querer chegar à meta de carbono zero em 2050.

Vamos focar em indústrias mais verdes e menos castanhas, progressivamente. Portanto, a alocação de recursos à economia vai passar, também, a ser feita com fatores ambientais

Constantino, inclusivamente, aponta que existirão alguns “vencedores” como resultado do panorama atípico que testemunhamos nos dias que correm. O software digital, as tecnologias limpas, a segurança, a cooperação no combate às alterações climáticas e os processos de automação irão estabelecer-se, através de uma lógica global que, embora desigual, irá ativar mais progresso e acelerar as melhorias. O desafio não se torna menor, mas a gestão estratégica será sempre a resposta para escapar ao colapso.

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